segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Discurso

Vamo, vamo.
Vamo simbora!
Que a noite já caiu
os carro tão na avenida
e eu quero tirar o meu.

(Já dizia Francisca, a puta mais velha da praça da Aliança)

Tatuagem

Preciso escrever alguma coisa no meu braço
Algo que me lembre quem sou
Quem sou...
Quem sou?

Há tatuagens que não se apagam
e que tinta nenhuma no mundo possa cobrir.

(Marcelo Prado)


segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Ângela!

Era por volta das quatro da tarde. O sol torrava minha cuca. Tava tão forte que eu quase poderia ver miragens ou alucinações. Bem, eu estava voltado pro escritório depois das minhas quatro horas de almoço. Decidi ir a pé mesmo. Tava com preguiça de pegar ônibus e coisa e tal. Andei alguns quarteirões. Distante, pensativo, eu seguia com as mãos nos bolsos e cabisbaixo. Foi quando percebi que um baú parara no ponto a minha frente, e dele descera um passageiro. Melhor dizendo; uma passageira. De primeira não dei muita bola, estava distraído. Tava com uma puta vontade de fumar, mas tava quebrado, sem nenhum puto no bolso. Foi quando, como que por acaso, senti o cheiro do tabaco queimando no ar. Olhei para frente e vi... Uma deusa, ou uma diaba, não sei.
A moça que descera do ônibus. Era loira. Tinha os cabelos na altura dos ombros, pontas levemente onduladas. Blusa vermelha. Calça jeans, tão apertada que parecia que iria estourar. Tinha um olhar gélido, maligno. Mas um belo par de ancas, e que anda meu Deus! Os seios, pareciam estar prestes a saltar da blusa direto na minha cara. Sim, eu a observava como um velho tarado. Talvez ela não estivesse percebendo, afinal eu estava de óculos escuros.
Após descer do ônibus, ela parou, puxou um cigarro da bolsa, que trazia de lado, e o acendeu. Aquilo foi fulminante. Achei que fosse morrer naquele momento. quisera eu ter uma câmera fotográfica para documentar aquele momento. Enfim, fiquei estonteado. Ela parecia caminhar em slow motion.
Ao passar por mim ela simplesmente ignorou. Não me notou, ou fingiu não notar. Parei por um instante, abaixei os óculos e dei meia volta. Ma aproximei e disse:
-Olha sei que não nos conhecemos ainda, mas a moça me cederia um cigarro?
Ela parou, me olhou com certo desprezo. Não sei ao certo descrever, tinha seriedade no olhar, misturada com benevolência. Não falou nada, apenas me deu o cigarro.
-Obrigado. A propósito, meu nome é Henry. Henry Chinaski.
Ela me olhou com indiferença.
-Você... você tem cara de Ângela. Ângela. Tem um rosto angelical. Que tal uma cerveja?
-...!- Ela continuava emudecida. Apenas elevou uma das sobrancelhas.
-Que tal? Só tem um detalhe. Eu não tenho nem um puto sequer no bolso. Então você é quem vai ter que pagar.
Ela se virou. Eu acendi o cigarro. Ela tornou a cabeça e disse: Vem!
Eu fui. A segui. Fomos até sua casa. Entramos, ela apontou o sofá e foi até a cozinha. Voltou com duas latas de cerveja.
-Gosta?- Me perguntou.
-Antartida! A minha favorita.- Sorri.
Bebemos algumas latas. Não falei muita coisa. Apenas elogiei a casa. Ela permanecia calada. Apenas continuava a me olhar com aqueles olhos frios. Estávamos a uma distância de uns três metros um do outro. Me levantei, me aproximei, pus minha mão em sua nuca e a puxei com força. Dei-lhe um beijo violento. comecei a apalpar-lhe as carnes com vontade. Arranquei-lhe a roupa e quando dei por mim estávamos transando num ritmo estranhamente violento. Era insano, eu nem mesmo sabia seu nome. Porém não me importei. Fodi, fodi com força. Fiz ela gritar e espernear. Ela cravou as unhas na minha pele com tanta força que fiquei em tons de listrados.
Passadas duas horas de violência, finalmente nos encontrávamos desfalecidos sobre o tapete da sala. Fumávamos, olhando para o teto, calados. Eu cá, ela lá. Até que ele soltou:
-O que você faz da vida?
-Eu?- Perguntei- Nada.
-Nada. Não possível que alguém não faça nada!
-Tá... então... eu sou um bilionário excêntrico. É isso.
-Você é mesmo um presunçoso! Henry Chinaski! Tenho cara de burra? Só porque sou loira? Acha que não sei quem foi Bukowski? A julgar pela tatuagem no seu braço você acha mesmo que é algum tipo de discípulo dele.
Continuei calado. Me levantei e pus as calças. Sorri. terminei de me vestir e dei as costas. Ela se levantou, trouxe um pedaço de papel até mim e disse:
-Aqui, meu número. Me liga.
-Claro.- Sorri de novo.
Então parti. Levei apenas mais uma lata de cerva e um cigarro. À poucos metros da casa dela o acendi. Continuei meu caminho, ainda tinha que pensar em alguma desculpa para dar pra minha chefe. O sol já tinha ido repousar. Joguei o pedaço de papel com o telefone fora. Não queria vê-la novamente. Seus olhos me davam medo. Voltei para casa.
Ainda não sei bem ao certo se tudo isso realmente aconteceu ou se foi apenas mais uma vertigem. Como disse antes, o sol tava foda. Queimando minha cuca.

domingo, 15 de agosto de 2010

Um poema para a moça que pede poemas.

Quando vejo o sol
as estrelas
a lua
os arranha-céus
um cadillac 73
ou uma bela mulata
eu sinto a poesia.
Eu sinto a poesia vindo
arrombando caminho garganta a fora.
Quando te vejo
não sinto nada.
Só desespero.
O coração sem controle
os pulmões cansados
as pernas tremendo.
Me sinto debilitado.
Embasbacado.
Mas poesia
não.
Não a sinto
não sinto nada

(Alberto Salgado)

Mensagem de bom dia!

Sabe o que sinto?
Sinto que te tiraram de mim.
Sinto que enfiaram a mão pela minha goela
e arrancaram sem nenhuma piedade meu coração
junto com as tripas
o estômago
e os pulmões.
Tudo de uma vez.

Hoje acordei com saudades de você.
E não me conformo.
Não me conformo em perder o cupom premiado da mega-sena.

Por fim,
você é um inconveniente na minha vida.
Me faz chegar bêbado no trampo
e até oferecer meu cu para um cara chato dando em cima de ti.
Você é meu incoveniente favorito!


(Alberto Salgado)

sábado, 31 de julho de 2010

O último trago.


Quando Margie e eu nos conhecemos ainda éramos bem jovens. Eu com vinte ela com quatorze. Éramos pessoas estranhas e mutuamente interessantes. Nos conhecemos nas férias de inverno, morávamos há cerca de 2.200 quilômetros de distância um do outro. Nos casamos seis anos mais tarde. Não vou contar como foram os primeiros encontros, nem como foi o casamento, a lua de mel, ou mesmo como perdemos a unica chance que tivemos de gerar prole. Vou contar como tudo acabou. Estudei jornalismo, publicidade, fiz mestrado, me tornei escritor, fui músico, lecionei por um certo tempo (quando a grana apertou), me tornei velho. Margie se formou em direito, fez mestrado, fez doutorado, advogou, se tornou juíza; e também envelheceu. Conhecemos metade do mundo juntos, insisti bastante para que conhecesse-mos a outra metade mas ela dizia que não valia a pena. Ela achava aquela outra metade sem graça. Ela se aposentou aos sessenta. Eu sempre fui um vagabundo aposentado. Um dia qualquer a levei ao médico, exames de rotina, coisas que os velhos tem que fazer. Não fora um dia qualquer. Já havia alguns meses que ela apresentava uma tosse estranha, parecida com tosse de cachorro. Talvez fosse alguma alergia, eu disse. Câncer, disse o médico. Câncer de pulmão. Como é possível? Eu disse. Margie nunca fumou! Eu sim, fumo desde meus dezenove, não tenho a saúde perfeita, mas não estou nem perto de ter um câncer. Bem, seja como for, foi. Ela se foi, não passado mais que oito meses. Ela não teve chance. Margie nunca foi o tipo religiosa extremista, mas de vez em quando me convencia a largar a bebedeira e ir a igreja. No início da doença fiquei preocupado, talvez a culpa fosse minha, talvez toda aquela fumaça que baforava tivesse ido para os pulmões dela. Mas tal teoria era fora de hipótese, levando em consideração o fato de eu nunca ter fumado a menos de cinco metros de distância dela. É verdade que eu fumava um maço por dia e passava cerca de oito horas de todos os dias bêbado, mas nunca paguei vexame para ela. Nunca quis ser o tipo de bebum enjoado e cansativo. Respeito, se não fosse por amor, era por respeito. Após o velório ainda passei alguns dias dentro de casa, em choque. Agora eu estava mais sozinho do que jamais estivera antes. Fiquei uns quinze dias sóbrio. Depois de trinta anos sem parar de beber, quinze dias parecem uma eternidade. Eu gostaria de me debulhar em lágrimas, mas eu não pude, não conseguia. Eu gostaria de acreditar que faria tudo diferente, e que isso faria diferença, mas eu não pude, não conseguia. Eu gostaria de entender o 'porque', mas não pude. É o que me dizia a porra do código genético. Nesse momento da minha vida eu me sentia mais um morto-vivo. Você conhece os mortos-vivos pela amargura que trazem na voz e a sede de vingança da vida que trazem no olhar. Perdido no espaço sideral. Ela sempre dizia que eu era muito metafórico. Eu metafórico e ela literal. Eu não tinha muito pra fazer, eu tinha grana suficiente no banco para ficar sentado bebendo o resto da vida, uma puta casa na praia, três carros e uma moto na garagem, mas nenhum ânimo. Nada mais valia a pena, nada. Procurar outra mulher? Eu já não tinha mais idade pra isso. E além do que eu nunca gostei muito de sexo. O melhor parceiro que tive na cama até hoje fui eu mesmo.

Era domingo, acordei antes do sol raiar e tomei sozinho meu chimarrão. Fiquei inquieto com algum sonho que tive, não me lembro sobre o que. Vesti uma boa roupa, entrei no meu fusca azul e fui a igreja. As pessoas estranharam a minha presença, pensavam que depois da morte de Margie jamais teriam o desprazer de me encontrar novamente, mas lá estava eu. Era uma igreja muito bonita, admito. Toda feita em madeira, estilo clássico americano. Esses americanos são mesmo muito cheios de frê-quê-quê. Me sentei na quarta fileira, observei o pastor dar início ao culto. Ele pediu que todos ajoelhassem para uma oração. Eu também me ajoelhei. Nesse momento pensei "O que diabos estou fazendo aqui? Será que estou tão desesperado a ponto de procurar nesse monte de gente vazia algum conforto?". Sempre os achei muito vazios, frígido. São pessoas que passaram pela vida sem usufruir porra nenhuma. Não bebem, não fumam, não fodem, não xingam. Acham a pior coisa do mundo pecar, mas pecam mesmo assim. Vivem em estado constante de auto-flagelação e não percebem. Lutam contra suas próprias naturezas como se lutassem contra o diabo. Não passam de ignorantes que acordam cedo no domingo. Levantei-me no meio da oração, dei as costas para o pastor, e sai corredor a fora, tirei um cigarro do bolso, acendi lá dentro mesmo, vi a cara dos paspalhos me olhando como se eu fosse o próprio zebu e sai. Voltei para casa e dormi até umas três e meia da tarde. Depois fui a um supermercado, comprei uma caixa com doze latas de cerveja e dirigi para a praia. Estendi uma cadeira na areia, abri uma latinha, dei uma golada, estiquei meu velho corpo e acendi outro cigarro. Coloquei-o entre meus dedos, médio e anelar da mão esquerda, e fiquei matutando. Deve ser triste ser um cigarro, sua vida é curta e só serve para satisfazer o vício e alguém. Fiquei vendo ele queimar, filete após filete, até chegar perto do fim, perto do filtro. Então levei-o a boca, e dei uma bela tragada, com bastante força. No cigarro eu busco a boca daquela que não tenho. O último trago num cigarro é sempre o mais forte, venenoso e saboroso. É como um último beijo em uma pessoa amada.

Dom Ninguém

Sou Dom sem pés,
Dom sem escada,
Dom sem família.
A moça se importaria de descer do balcão para conversarmos?

Sou Dom que bebe,
Dom que fuma,
Dom que fode.
A moça se importaria se não conversasse-mos muito?

Sou Dom sem viola,
Dom sem rosas,
Dom sem alma...
A moça se importaria se não usasse de palavras bonitas?


(Alberto Salgado)

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Surfando nas Minas Gerais

Minha família
morta
morrida
Minha família
viva
vivida

Sabe aquela sensação de chegar num lugar desconhecido
e mesmo assim se sentir em casa?
Ou a saudade que bate de todas aquelas velharias que você conheceu a vida inteira?

Isso é família.

Memória
morta
morrida
viva
vivida
Família.

(Marcelo Prado)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

00:51

Ele liga a TV - Essa mulher é muito cafona. Quando eu a vejo, lembro de você.
Ela - Hmn, muito obrigada... - pura irônia.
Ele retoma - Acho que é o cabelo dela.
Ela retruca - Muito obrigada! - ele está caminhando em terras perigosas e não sabe.
Ele continua - Quando vejo um relógio tictáqueando, lembro de você.Quando vejo um ônibus lotado, eu lembro de você. Quando eu vejo uma criança banguela, lembro de você. Quando vejo uma joaninha, eu lembro de você.Quando vejo meus pés molhados, depois do banho, lembro de você. Quando eu vejo meus dentes, no espelho, cheios de creme dental, lembro de você. Quando eu vejo um casal de velhinhos, bufando por ai, lembro de você. Quando eu vejo o teto do meu quarto, assim que acordo, a primeira coisa da qual lembro é de você.

(eu, ontem a noite, lembrando de você)

quarta-feira, 24 de março de 2010

Trecho de "Em uma maré de azar"

"Eu costumava pensar que os personagens sim eram interessantes, e que os escritores eram os covardes que tentavam de alguma forma usar a escrita para se realizarem naquilo que jamais poderiam ser, pensei "Que diabos, eu quero é ser um personagem! Isso sim deve ser legal." e finalmente me tornei o que eu gostaria de ser "Um personagem". Mais uma porra de personagem, mas que merda; eu penso agora, os personagens não fazem nada, os escritores é que escolhem o que eles devem fazer ou deixar de fazer, só merda, são esteriótipos. Fudidos ou fodões, seja o que for são apenas personagens. Que se foda eu gostaria mesmo é de ser um escritor."

Besteiras essenciais

Vê como nos tornamos tão necessários um ao outro?
Vê?
Estranho...
Eu acho.
Vê como dois dias sem nos vermos são uma eternidade?
Pequenas eternidades.
Vê como as brigas são saborosas?
Vê?
O que é isso, eu não sei
Acho que são as besteiras essenciais.
Idiossincrasias
Destino
Estranho...
Você ainda é dissimulada
Eu uma icógnita
Porque
Ainda somos dois estranhos.

(Flávio Linhares)

segunda-feira, 22 de março de 2010

Sobre o azar.

Ela pergunta:
e vc esteve bem todos os dias?
Eu respondo:
(risos)
Eu estou anestesiado
Quase consigo ficar com raiva
mas não sai
Quase consigo ficar triste
mas não sai
Quase consigo ficar alegre
mas não tenho porque.

(Marcelo Prado)

terça-feira, 16 de março de 2010

Século XX

Sabe o que eu acho mais belo no século XX?
É essa capacidade escrota que adiquirimos de achar beleza na mediocridade.
Sim, a 50 anos atrás existia gente fazendo arte de verdade
Hoje, jogar o cartão de crédito no lixo pode ser arte.
Aprendemos a endeusar o medíocre
Afinal
Não existe nada mais original.

(Marcelo Prado)

Maturidade

Olha só
Eu preciso mudar
Eu sei que preciso
Mas mudar para o que?
Eu não consigo ser convencional, controlado.
Sei que tudo tem um limite
Mas ser simplesmente um homem comum...
Um homem contido demais é regido pela esposa.
Um homem extravagente demais é regido pelo pau.

Bem... eu ainda não tenho esposa.

(Alberto Salgado)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

"O Clube dos Anti-sociais"

Não somos nada originais com nossas poses, mas pelo menos temos estilo.
Não somos nem um pouco descolados só por usarmos all star, fumarmos ou beberbos, mas pelo menos temos estilo.
Temos nosso estilo, que não é nosso.
Mas quem é dono desse ou daquele estilo, quem os inventou? Ainda vive?
Não sabemos nada, não temos as respostas para as questões existênciais da vida...
Mas pelo menos temos estilo.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Reticências.

Já faz dois dias que não conversamos,
já faz praticamente uma semana que não ouço o som da sua voz...
Preciso muito ouvir a sua voz...
Preciso dizer que te amo e ouvi-la suspirar dentro de um sorriso silencioso.
Preciso de você.

Os vagabundos também amam...

(Alberto Salgado)